Ericka Rolim: da extravagância às pesquisas da cozinha popular

Ericka Rolim: da extravagância às pesquisas da cozinha popular

Ericka Rolim é o nome à frente do Queens Cozinha Extravagante, em Boa Viagem. Créditos: Gabi Vitória/Divulgação

Por Diogo Carvalho

Extravagância não é uma palavra que podemos associar à figura de Ericka Rolim, mas que, com certeza, traduz muito da sua gastronomia. Nome à frente do pub Queens Cozinha Extravagante, em Boa Viagem, mantém a fidelidade dos clientes com combinações inusitadas em sanduíches gourmet, nos quais ingredientes como lagostins, abacate, lombo de porco e abacaxi caramelizado casam em perfeita harmonia. Quem chega ao pub pela primeira vez e dá de cara com a discreta chef nem desconfia da feitiçaria que ela consegue com as panelas.

Nascida em Sumé (PB), veio morar no Recife aos 3 meses de idade. A cozinha sempre foi o principal local de socialização da família Rolim. Era lá que todos passavam a maior parte do dia. “Acho que a primeira lembrança que me vem à cabeça da minha infância sou eu, aos 6 anos, sentada no balcão do bar do meu pai, hoje com 90 anos”. O bar de seu Benjamin Rolim funcionava exatamente com a lógica que Ericka opera o Queens: uma pessoa no balcão e a mãe dela, Cremilda (cozinheira de mão cheia), no comando da cozinha. “Servíamos clássicos populares que tento reproduzir até hoje, uma cozinha super afetiva com feijoada, dobradinha, rabada. A afetividade e a alegria de fazer essa comida sempre foi o componente principal da minha cozinha, primeiro ensinamento que tive com a minha mãe”, lembra.

Os primeiros passos no mundo dos sabores se deram ali, na tentativa de replicar essa cozinha ancestral e matriarcal. O primeiro empreendimento foi o SaladaBox, um takeway de saladas. Depois, um delivery. “Trabalhei muito tempo com catering (fornecimento de comida preparada para grandes grupos) para produtoras de filmes, na Fiat. Ainda continuo fazendo, especialmente para empresas de tecnologia. Mas queria algo com minha cara, para mostrar a minha cozinha para um público maior”. Foi aí que surgiu a ideia do Queens, há cerca de três anos, um trailer diferente estacionado na Estrada do Arraial, no Parnamirim, na época do boom dos food trucks.

No cardápio, sanduíches gourmet com explosão de sabores

A “extravagância” da nova empreitada estava em tudo: nos ingredientes, nas técnicas utilizadas nos preparos e, principalmente, na surpresa no paladar. Ao observar o menu pela primeira vez, era difícil imaginar como aquelas receitas poderiam ser preparadas num truck. Um dos carros-chefes da época (e que segue no cardápio até hoje no descolado pub), o Nina Hagen, por exemplo, apostava num clássico alemão, o schnitzel (lombo de porco esmurrado e empanado) para compor um sanduíche que leva ainda queijo gouda, geleia de bacon, maionese da casa, salada e uma rodela de abacaxi caramelizado. Um choque de texturas a cada mordida.

Foi só com uma década de cozinha, já aos 30 anos, que Ericka entrou numa graduação de gastronomia. “Minha atualização, para além da técnica, é uma pesquisa intensa sobre a ancestralidade na cozinha. Costumo percorrer duas vezes ao ano o Sertão nordestino e essa ‘arqueologia’ dos saberes culinários”. Depois de anos elaborando técnicas, percebeu que o mais importante em seus estudos era de fato mergulhar na antropologia, nessa pesquisa delicada e afetiva das tradições culinárias do povo. “Meu pai sempre me arrastava com ele pelo interior do Ceará, Paraíba e Pernambuco, desde muito nova. É uma paixão antiga”.

O Queens é, de fato, o grande xodó. É o lugar de experimento de todo esse percurso como cozinheira. “Quando começamos, era um delivery de almoço comercial. Passamos para o food truck, elaborando um cardápio voltado para comida de rua, e hoje temos o nosso pub. Esse novo cardápio vem com todo esse turbilhão de referências, vamos desde os sanduíches suínos até pratos veganos”, destaca.

O falafel, por exemplo, é resultado de uma pesquisa embrionária sobre as dietas restritivas, com o desafio de elaborar quitutes que pudessem oferecer extravagância também aos veganos. Depois de mais de 40 tentativas, ela chegou ao Gulabi, um pão pita sem glúten recheado com falafel – bolinhos árabes de grão de bico, quinoa e amaranto -, pasta de amendoim, tahini, maçã, pepino e salada. Todos os empanados não levam ovo ou leite, diz: “É só farinha e pimentas”. No almoço dos fins de semana, ela investe na pesquisa regional, com receitas populares clássicas, a exemplo da feijoada e do arroz de caldeirada.

Os planos da chef, hoje com 32 anos, é partir num mochilão pela América Latina, fazendo um roteiro de sabores. “A ideia é começar pela Colômbia e subir até a América Central. Não descarto passar pela Ásia futuramente. Tem muito desses temperos orientais milenares que e me despertam muita curiosidade. Todas essas culturas estão dentro da minha pesquisa de cozinha ancestral, que atravessa saberes populares, geografia e gerações. Uma cozinha vinda do povo para o povo”.

 

Author: Diogo Carvalho

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