Abstração e autoconhecimento: Antônio Mendes conta sobre sua nova exposição

Abstração e autoconhecimento: Antônio Mendes conta sobre sua nova exposição

Crédito: Reprodução/Arquivo Pessoal

Inconformado com o status quo. É assim que melhor podemos definir o momento do artista Antônio Mendes, que inaugurou, no dia 13 de novembro, mais uma exposição. Ego em Suspensão e Fragmentos de Luz, que está em cartaz na galeria Garrido, em Casa Forte, representa uma nova etapa em sua carreira. Antônio afirma estar em um estado de transição. Ao buscar novas perspectivas sobre questões intrínsecas a nossas vidas, o pintor afirma estar sempre em busca da autenticidade.  “A minha inquietação me empurra a buscar além do que eu já fui e já sou, entre todas as referências as quais já dialoguei. O que eu vou achar, eu não sei. Mas estou em trânsito.”

Foi a partir dessa inquietação que Antônio começou a desenvolver as obras para sua nova exposição. O artista conta que o projeto Ego em Suspensão e Fragmentos de Luz começou a tomar forma a partir de uma insatisfação que tinha com o que estava trabalhando na época. “Sentia uma vontade de mudar algo, entrar por outros caminhos, enveredar por outras formas. Não sabia ao certo o que poderia acontecer, mas comecei a sentir esse incômodo e a necessidade de me transformar.”, relata Mendes, que comemora 30 anos de carreira como pintor.   

Antônio Mendes, Armando Garrido, e a equipe responsável pela organização e curadoria da exposição, Phantom 5, na inaguração da exposição ‘Ego em Suspensão e Fragmentos de Luz’. – Crédito: Reprodução/Instagram

Apesar de cultuar a arte desde criança, Antônio Mendes não considerou a possibilidade de fazer da arte sua profissão até os 23 anos de idade, quando se encontrou descontente ao cursar Educação Física. “Foi aí que comecei o meu  primeiro curso de desenho e pintura, no sítio histórico de Olinda, com o professor Amaro Crisóstomo. Quando terminei esse curso, continuei a estudar, dessa vez no Museu de Arte Contemporânea, também em Olinda.”, lembra.

Ainda que sempre com um olho para obras mais abstratas, Mendes pontua que, após concluir seus dois primeiros cursos de desenho, começou sua carreira pintando figuras mais definidas, como paisagens.  “O meu estilo foi criando forma. No começo pintando paisagem – com as referências de Zé Claudio, que me acompanhou em boa parte da minha profissão. Foram muitos anos somente nisso, mas sempre flertei muito com o figurativo.”

Crédito: Reprodução/Instagram

Desde então, Antônio dedicou sua vida aos mais variados projetos – todos que, por sinal, carregam um significado único para ele. Entre suas exposições, temos como exemplo sua exposição vinda de uma releitura da obra Casa Amarela, de Van Gogh – que teve uma das obras presenteada à Francisco Brennand. Além de A persistência da paisagem, que foi sua última exposição individual, e O beijo. No total, Mendes tem mais de 60 exposições.

Confira a entrevista completa:

Como começou sua carreira nas artes plásticas?

Eu gosto de desenhar e pintar desde pequeno. Em 1988, aos meus 23 anos, estava cursando Educação Física na UFPE, mas não me sentia satisfeito com o curso. Até então eu nunca havia considerado a possibilidade de trabalhar com arte, mas decidi que poderia seguir esse caminho. Foi aí que comecei o meu  primeiro curso de desenho e pintura, no sítio histórico de Olinda, com o professor Amaro Crisóstomo. Quando terminei esse curso, continuei a estudar, dessa vez no Museu de Arte Contemporânea, também em Olinda. Esse curso me deu a oportunidade de estudar mais afundo outras questões menos técnicas da pintura.  Com isso, o meu estilo foi criando forma. No começo pintando paisagem – com as referências de Zé Claudio, que me acompanhou em boa parte da minha profissão. Foram muitos anos somente na paisagem, mas sempre flertando muito com o figurativo.

Antônio Mendes na inauguração da exposição ‘Ego em Suspensão e Fragmentos de Luz’, em cartaz na Galeria Garrido. – Crédito: Reprodução/Instagram

Qual a marca/temática da exposição dos seus 30 anos, ‘Ego em Suspensão e Fragmentos de Luz’?

Em 2016 eu comecei a me sentir incomodado com o que estava fazendo. Sentia uma vontade de mudar algo, entrar por outros caminhos, enveredar por outras formas. Não sabia ao certo o que poderia acontecer, mas comecei a sentir esse incômodo e a necessidade de me transformar.  Esse projeto está intimamente ligado a minha trajetória de autoconhecimento, que, pela primeira vez em minha carreira, se torna um diálogo externalizado.

A exposição ‘Ego em Suspensão e Fragmentos de Luz’  vem como uma forma de expressar reflexões que são velhas companheiras minhas, como o que é minha vida e meu trabalho. É uma forma bem direta de me comunicar sobre essas reflexões. Uma leitura não meramente superficial de como eu enxergo as coisas ao meu redor.

A primeira parte do título, O ego em suspensão, significa a suspensão dos meus julgamentos. A prática de relativizar a leitura do que eu já sei, para que eu possa enxergar além.  Os fragmentos de luz vêm como resultado da suspensão do ego. Consigo ver, na situação que me rodeia, uma mensagem de luz. Ou seja, quando eu relativizo o meu saber e as minhas certezas, consigo encontrar um ponto de luz que até então não enxergava, ou de alguma forma rejeitava. Nela, as formas perdem a primazia. O contexto e o significado por trás das formas se tornam o protagonista. A subjetividade, então, se torna o ponto principal da minha obra.

A ideia do nome surgiu depois de formatar a exposição. Quando parei pra pensar em um nome, escrevi num caderno os pontos principais do projeto. Como eu já tinha essa ideia de só conseguir enxergar a subjetividade quando eu relativizo o meu ego, o nome surgiu.

Paisagem Litorânea II | Acrílica sobre tela. Uma das obras da exposição ‘Ego em Suspensão e Fragmentos de Luz’ – Crédito: Reprodução/Instagram

Como classificaria o estilo que você adota?

Em trânsito. É a melhor maneira de explicar a minha experiência.O meu talento não se satisfaz com o já feito. Esse estar em trânsito, significa, pra mim, a busca pela autenticidade. A minha inquietação me empurra a buscar além do que eu já fui e já sou, entre todas as referências as quais  já dialoguei. O que eu vou achar, eu não sei. Mas estou em trânsito.

 

Quais artistas você mais admira?

Não tenho como falar todos pois são muitos. Mas Van Gogh é um pintor que eu me identifico bastante. Admiro Picasso na inovação, Cezanne nas paisagens, Monet e o impressionismo, Francis Bacon… Busco referência em todos eles, bem como fui buscar com o mexicano Diego Rivera, quando estava a pintar figuras humanas. Essas referências vão se transformando.

 

De onde vem sua inspiração?

Tudo é inspiração e tudo é aprendizado. Sempre podemos ampliar nosso conhecimento. É uma tarefa infinita enquanto estivermos vivos. Minha inspiração vem das experiências que eu vivo e do que acontece no mundo. É um processo contínuo de reflexões vindas do espelho do mundo.

Uma das obras do projeto de releitura do quadro ‘A Casa Amarela’, de Van Gogh. – Crédito: Reprodução/www.antoniomendes.com.br

Quantas exposições você já realizou?

Tenho muitas individuais e muitas coletivas. Algumas que tiveram destaque são a Casa Amarela, que foi emocionalmente muito densa;  A persistência da paisagem, minha última exposição individual, que  apresenta um descompromisso com a forma e construções de cidades subjetivas – fora de lógica e de uma arquitetura absurda; e a O Beijo, que foi muito leve.

 

Como é sua sistemática de trabalho?

Eu pinto todos os dias, menos aos domingos. Venho pro ateliê, e pinto de cinco a oito horas por dia. Me considero mais pintor do que artista, por levar um trabalho mais braçal. As vezes fico dias em um único quadro, sem certeza nenhuma de que resultará em algo bom. É um processo de se encontrar.

 

Qual é o maior desafio de trabalhar com artes plásticas?

O maior desafio sempre é superar a si mesmo. Quando eu comecei, não imaginaria que traçaria o caminho que percorri. A dificuldade é insistir e lidar com a frustração. Tem coisas que não são aceitas mas que não deixam de ser boas. As dificuldades que enfrento são processos que todas as profissões pressupõe.

Uma das obras do projeto ‘A persistência da paisagem’. – Crédito: Reprodução/www.antoniomendes.com.br

Qual a obra que mais marcou a sua carreira?

Não tenho uma em específico. Cada uma tem um significado único. Não posso citar um quadro que tenha um componente emocional maior que outro. Cada quadro tem uma particularidade, uma extensão de mim. Seja ele mais figurativo ou uma paisagem mais definida.

Um quadro do meu projeto de releituras de A casa amarela, de Van Gogh, que presenteei a Francisco Brennand. Foi um quadro para a produção total da exposição, que ficava na minha reserva técnica, mas que apresentava um certo diferencial

Não posso citar um quadro que tenha um componente emocional maior que outro.

Outra obra que também marcou foi uma resultante de uma viagem que fiz para o Peru. Lá vi paisagens belíssimas, que me imergiram em uma contemplação de tudo que me cercava. Ao voltar para Recife, fiz um quadro sobre todo o meu trajeto pelo país – de Cusco a Machu Picchu. É uma obra muito carregada de sentimentos subjetivos que eu tive lá.

Uma das obras do projeto ‘O Beijo’. – Crédito: Reprodução/www.antoniomendes.com.br

Você sempre seguiu esse estilo abstrato em suas obras ou já passou por fases com diferentes estilos?

Eu tenho como característica pessoal uma inquietação muito grande. Faço muitas reflexões sobre o sentido da vida. Os meus quadros exploram esses questionamentos, que estão sempre carregados de traços emocionais.

 

Quais são os materiais que você mais gosta de usar?

Minha pintura é basicamente em acrílica sobre ou tela (majoritariamente sobre tela) e, eventualmente, eucatex.  Às vezes também uso pastel e monotipias, que servem como um exercício de produção.

 

Como funciona o processo de valoração de uma obra?

É mais simples do que parece. Tudo começa com uma referência de valor por m² de tela. Mensurar quanto custa um quadro – ao definir o valor do m² – leva em consideração o tempo que o artista tem de estrada, o que ele já fez e sua consistência.

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