Giro Blog

“O empoderamento político feminino é a principal bandeira que a Secretaria da Mulher do Recife está levantando hoje”, disse Cida Pedrosa

“O empoderamento político feminino é a principal bandeira que a Secretaria da Mulher do Recife está levantando hoje”, disse Cida Pedrosa

Cida Pedrosa, secretária da mulher do Recife – Crédito: Shilton Araujo/Esp.DP

Advogada e poetisa: essa é a pernambucana de Bodocó que comanda a Secretaria da Mulher no Recife. Ao chegar na capital do estado, na década de 1970, Cida Pedrosa descobriu o marxismo e a militância de esquerda, além de aperfeiçoar sua escrita. Ela já trabalhou como advogada no Sindicato de Trabalhadores Rurais e na FETAPE, foi secretária-executiva do Comitê Municipal de Direitos Humanos e Segurança Cidadã, além de exercer a função de secretária de Meio Ambiente e Sustentabilidade.

Já na vida de poetisa, as obras de Cida são cheias de empoderamento do discurso feminista e libertário. Livros como “Restos do Fim”, “O Cavaleiro da Epifania” e “As Filhas de Lilith” fazem parte de sua carreira como escritora, além de outros quatro livros de poemas publicados e participação em várias antologias no Brasil e no exterior. “Acredito na função social da minha poesia e, recentemente, percebi que há um recorte de gênero em todo o meu trabalho literário”, declara Cida. Ela também era uma das editoras do portal Interpoética, um dos maiores acervos da literatura pernambucana, que funcionou por 10 anos.

Crédito: Shilton Araujo/Esp.DP

Sobre sua relação com a política, Cida declara: “Lugar de mulher é onde ela quiser, inclusive no Parlamento, para que possamos modificar as legislações e garantir a luta pelos direitos das mulheres”. Confira uma entrevista exclusiva com a secretária da mulher sobre temas como a participação da mulher na política e a literatura:

Apesar de ser considerada a cidade mais feminina do país, as mulheres ocupam pouco espaço nos cargos parlamentares do Recife. Qual sua visão sobre isso? 

O Parlamento reflete, na verdade, a realidade do país inteiro. Nós temos poucas mulheres nos espaços de poder por vários motivos. Primeiro, nos foi negada desde a escolaridade, a cidadania por muitos anos. Só conseguimos votar há pouco tempo, em 1932, e pudemos nos candidatar um dia desses. Recife só teve 16 parlamentares até agora, a primeira foi Júlia Santiago, uma mulher negra, operária que homenageamos no ano passado. O empoderamento político feminino é principal bandeira que a Secretaria da Mulher do Recife está levantando neste 8 de março, porque lugar de mulher é onde ela quiser, inclusive no Parlamento, para que possamos modificar as legislações e garantir a luta pelos direitos das mulheres.

Por que migrar de uma trajetória de poesia para uma candidatura eleitoral? 

Eu não migrei. Na verdade, participo de muitas coisas. Sou uma mulher em mil mulheres como muitas outras mulheres o são. Sou poetisa em tempo integral, sou militante em tempo integral, sou mãe – nem em tanto tempo integral assim. Sou política em tempo de militância. Entendo o Parlamento como um espaço de luta para as mulheres e para nós melhorarmos a vida do país. Para travar a luta de classe, de raça, de gênero, para travarmos a luta LGBT, dos que não têm suas vozes escutadas, acho que é importante uma candidatura progressista e por isso me candidatei. E além de toda essa trajetória de lutar pela cidadania, tenho uma trajetória de luta na cultura porque acho que é importante, no Parlamento, ter uma representante desse campo. Portanto, não migrei. Estou em todas as frentes que eu acho importante participar.

Crédito: Shilton Araujo/Esp.DP

Como você se descobriu na poesia e percebeu que o poder de suas palavras poderia ajudar outras mulheres?

Eu tenho uma poesia que tem um recorte feminista. Tenho um livro chamado “As Filhas de Lilith”, que é um abecedário de mulheres onde trato várias questões relacionadas às nossas vidas. Vai desde a questão da orientação sexual a você ser mãe num mundo que é extremamente adverso para exercer a maternidade, entre outros debates. Acredito na função social da minha poesia e, recentemente, percebi que há um recorte de gênero em todo o meu trabalho literário. O erotismo tão presente nos meus livros é mais do que um estilo literário porque sai da boca de uma mulher. Mulheres falando sobre sua sexualidade de forma aberta é uma revolução.

Quais as dificuldades para se produzir literatura e desenvolver seu papel de secretária da mulher em Pernambuco?

É muito difícil juntar isso. Ser mulher, gestora e poeta é muito difícil. Sofro muito porque nem sempre eu consigo dar vazão à minha arte como eu gostaria, já que trabalho dez, onze horas por dia. Nem sempre tenho o espaço-tempo que eu gostaria de dar à minha poesia e isso me faz sofrer.

Você sente dificuldades por estar inserida em um contexto profissional dominado por homens? 

Eu acho que o contexto profissional é extremamente masculino ainda e isso é uma luta diária para o seu empoderamento, o das colegas e os das demais gestoras públicas. Porque não é por decreto e não adianta o prefeito dizer que somos todas iguais, já que as pessoas são criadas de forma machista e isso reflete diretamente no ambiente de trabalho. Então, uma mulher feminista, empoderada, tem que estar travando essa luta o tempo inteiro para que os homens compreendam. Fazemos essa luta de forma bem humorada, construindo pontes, uma boa luta. Uma luta de ideias. Só não sou terna com quem é machista, feminicida e violento, aí não sou terna nem um pouco.

Crédito: Shilton Araujo/Esp.DP

Na sua opinião, políticas de incentivo podem facilitar a ascensão das mulheres na economia e no mercado de trabalho? 

Sou a favor das cotas sim. Acho que deveria ter mais espaços para as mulheres, principalmente em locais que ainda são extremamente masculinos. E estamos fazendo isso com a robótica, por exemplo. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) tem uma pesquisa que diz o maior mercado de domésticas do mundo é no Brasil, ou seja, são mulheres negras e de baixa renda que estão nessas profissões. Tenho todo respeito pelas trabalhadoras, mas isso reflete um sistema escravocrata em que vivemos e que rebate diretamente nas mulheres. É extremamente importante termos a presença de mais mulheres em áreas como Ciências da Computação, engenharias, nas ciências exatas em geral, áreas que o tempo inteiro são colocadas como masculinas. Estamos, aos poucos, mudando essa realidade.

Crédito: Shilton Araujo/Esp.DP

Seria possível fazer um comparativo da atuação das mulheres recifenses em importantes cargos de destaque nos últimos anos? Quais as expectativas e projeções para o futuro? 

Temos vários exemplos de gestoras maravilhosas tanto na área pública como na privada. A Academia Pernambucana de Letras, por exemplo, está na sua terceira presidência de mulheres com gestões brilhantes. Luciana Santos foi prefeita de Olinda e, hoje, é a única deputada federal de Pernambuco, além de ser a primeira mulher presidenta de um partido político em nível nacional. Temos diretoras de clubes de futebol, entre outras tantas mulheres que vêm ganhando destaque ao longo desses anos. Acredito que estamos mais empoderadas e mais conscientes da importância da nossa participação nos mais diversos espaços de poder.

Você deseja realizar algum projeto pessoal ou profissional este ano? Um novo livro, talvez?

Acabei de escrever um livro e vou viajar por alguns estados para lançar meu trabalho e, principalmente, falar de literatura de mulheres. Na Secretaria, os planos andam de vento em polpa, estamos construindo uma política sólida de garantia de direitos das mulheres.

Compartilhe este post