Roger De Renor prepara festa e documentário para os 10 anos do Som na Rural

Crédito: Arquivo Pessoal
Há dez anos, Roger de Renor recebeu um convite inusitado. Seu amigo e sócio, Nilton Pereira, pediu ajuda para transformar a sua velha Ford Rural em um estúdio itinerante de música e ações culturais para serem veiculados na TV Brasil. A famosa rural, intitulada por eles de Veículo AutoEmotivo de Comunicação Urbana, desde então, além de um equipamento de intervenção cultural de rua, se tornou um projeto de audiovisual.

Roger e o parceiro Nilton Pereira – Crédito: Arquivo Pessoal
A proposta que está inserida dentro dos preceitos da economia criativa, de viés colaborativo e com iniciativas sociais, culturais e ambientais, completa uma década com a mesma alegria que começou. Unindo diversos artistas do cenário musical pernambucano e brasileiros, foca na valorização da cultura popular. Foram inúmeras estradas, eventos, intervenções e estados percorridos pela Rural colorida brilhante.

Crédito: Arquivo Pessoal
Roger construiu a sua trajetória ligada inteiramente à cena cultural brasileira e dedicou várias décadas às artes. Carrega também uma forte relação com o Manguebeat, movimento proveniente de Pernambuco, que se tornou referência na descentralização da produção cultural no país. Hoje, através do Som na Rural, leva muitos artistas para as ruas acompanhado do seu caricato Ford. Em paralelo, está produzindo um documentário para representar os anos de trajetória do equipamento cultural móvel, que deve ser lançado em breve. “Estamos produzindo um documentário para registrar os caminhos percorridos pela Rural ao longo desses anos. O nome será Som na Rural 10 anos Indo e Voltando. Começaremos a gravar nas margens do Capibaribe, na rua da Aurora e iremos até o Sertão, na beira do São Francisco registrando artistas e manifestações culturais do nosso estado”, revela. Em entrevista ao Blog João Alberto, ele conta como tudo começou e os projetos que pretende investir daqui pra frente. Confira:
Como você avalia o Som na Rural depois de uma trajetória de 10 anos?
O projeto Som na Rural como acontece hoje é quase como uma união de relações entre conceitos e experiências da Soparia do Pina, bar em que atuei por quase dez anos, e da TV Viva do Centro Luís Freire, em Olinda, de onde vem meu parceiro e sócio Nilton Pereira, cineasta, diretor de fotografia e o verdadeiro dono da Rural como carro. Partiu dele o convite há dez anos de transformar a sua velha Rural em um estúdio itinerante de música e ações culturais para a TV Brasil. Durante esses anos, acompanhamos várias mudanças: na comunicação, na política, nas ocupações em reivindicação ao uso comum dos espaços públicos, nas discussões sobre a cidade, manifestações políticas apartidárias, etc. Hoje, se tornou um projeto com a perspectiva de compartilhamento para viabilizar projetos a partir de iniciativas que geram resultados na perspectiva da construção de um futuro melhor e um presente mais divertido também. Encaixo a Rural em um contexto mais lúdico, levando-a para dentro do espaço da memória afetiva e do simbólico.

Roger de Renor – Crédito: Flora Pimentel/Divulgação
Qual a importância que você atribui o projeto na sua carreira?
O Som na Rural nos mantém, tanto a mim quanto a Niltinho Pereira, de forma ativa, dentro de nossas áreas de atuação do audiovisual, da música e da comunicação de forma efetiva e independente. Além disso, o carinho, o respeito e a dignidade que as pessoas presentes nas ruas do Recife, pelo Estado de Pernambuco e nas várias regiões do Brasil que nos recebe. Como se nos devolvessem uma dignidade que, por muitas vezes, um sistema político nos tenta invisibilizar.

Crédito: Arquivo Pessoal
Quais discussões propõe à sociedade?
A sociedade é quem nos propõe as discussões. Quando estamos na rua, somos plataforma, veículo de interferência colaborativa. Infelizmente, as últimas pautas urgentes trazidas pela sociedade, ao invés de ser para continuarmos propondo avanços, tem sido as de resistir e denunciar a tentativas de retrocesso da garantia dos direitos conquistados nas últimas décadas. Além disso, nos últimos anos temos confrontado a chamada “camarotização” do carnaval do Recife, a descaracterização e a privatização dos espaços públicos .
Quais as maiores dificuldades na construção do Som na Rural?
Não posso dizer que tivemos dificuldades na construção, pois como produto audiovisual, o Som na Rural nasceu de forma bem profissional e pelas mãos de gente muito experiente na área como Nilton Pereira, Eduardo Homem, depois, como um equipamento cultural de rua e de intervenção urbana. Foi uma construção coletiva com vários atores e vozes espontâneas.
E a parte mais gratificante?
É o reconhecimento público, o respeito e o carinho da classe artística e a possibilidade de trabalhar dentro de nossa área de atuação podendo contribuir de alguma forma na construção de um mundo melhor.

Crédito: Arquivo Pessoal
Qual impacto do Som na Rural no cenário cultural recifense?
Recife, historicamente, é uma cidade de festas de rua, de movimentos populares, de mascates. Suas expressões culturais são únicas e democráticas. Em tempos em que a especulação imobiliária e o poder econômico se associam ao poder público, a cidade necessita de todo os recursos alternativos como forma de amplificação de sua voz e deixando claro que não abriremos mão de participar, de forma coletiva, da construção do Recife do futuro.
Já levou o Som Na Rural para outras capitais?
Sim. Nossa vedete, ou Veículo AutoEmotivo de Comunicação Urbana, como o definimos, já rodou bastante nesse tempo pelo Brasil, em várias capitais e cidades da Paraíba, Ceará, São Paulo, Alagoas, Bahia, Sergipe, participamos do aniversário de 50 anos de Brasília com uma grande Roda de Ciranda no Distrito Federal com Lia de Itamaracá e as Filhas de Baracho. Rodamos muito pelo interior do estado, principalmente para o Sertão que é atualmente nossa grande rota.
Quais os artistas que já participaram do Som na Rural?
Essa é uma das melhores partes. Quase não dá pra mensurar pela quantidade e variedade de artistas e músicos que se apresentaram no Som na Rural, mas citaria alguns mais conhecidos, não pela ordem de importância, mas como exemplos de diversidade de estilos que tivemos como: Claudionor Germano e o Maestro Ademir Araújo (Maestro Formiga), Lia de Itamaracá, Mundo Livre S/A (nossa primeira atração), Siba, Academia da Berlinda, Orquestra Contemporânea, Alceu Valença, Lula Cortês, Criolo, Otto, Karina Burh, Mombojó, Kátia de França, Devotos, Maciel Salu, Maestro Forró, Silvério, Lirinha, Ângela Ro Ro, Orquestra do Maestro Mozart Vieira, Wander Wildner, Banda Eddie, Coco Raízes de Arcoverde, Beth de Oxum, Bongar, Victor Araujo, Isaar e por aí vai…

Crédito: Arquivo Pessoal
Para o novo vídeo de divulgação, Joana Lira criou ilustrações exclusivas. Como foi o processo de criação?
Joana tem um olhar especial para um Recife sempre em movimento. Para essa data tão especial de 10 anos pedimos que fizesse um carimbo comemorativo e ela nos presenteou com tantas opções, com ilustrações de cores tão ritmadas que praticamente já eram animadas. Então, outro parceiro editor e músico, chamado Anderson Fernandes, fez a animação e Neílton, da Banda Devotos, sonorizou o que agora chamamos de vinheta colaborativa. Serão várias versões de animações e de sonorização por músicos parceiros. São detalhes de atenção, carinho e delicadeza que não caberiam em um ônibus, mas que amplificam o Som na Rural e ampliam a itinerância da cooperação e da generosidade.
O que você está preparando para a comemoração de 10 anos?
Teremos uma ampla agenda a começar agora esse mês com nosso sonhado projeto Ciranda Rural no Pátio de São Pedro que acontecerá, quinzenalmente, aos domingos a partir do último domingo de setembro, dia 30. A ideia é trazer de volta as tradicionais Rodas de Ciranda para o seu histórico reduto, unindo antigos e novos mestres e convidados ilustres como Siba e Isaar a tradicionais cirandeiros como Anderson Miguel, Filhas de Baracho e Mestre Bi. O encerramento está sendo pensado para as vésperas de Natal, em um domingo, dia 23 de dezembro, no Centro Cultural Estrela de Lia, em Itamaracá, com Lia de Itamaracá. Além disso, logo depois do carnaval, em março, começamos um novo projeto, no formato audiovisual para registrar esses 10 anos. Teremos também um Baile em comemoração aos dez anos no Clube Bela Vista, em novembro, com atrações ainda a serem divulgadas. Além do nosso pré-réveillon aberto lá na Aurora, como já estamos fazendo há alguns anos.

Crédito: Arquivo Pessoal
E sobre o documentário que você está produzindo, quais os detalhes, os locais de gravação, por onde já passou?
Estamos produzindo um documentário para registrar os caminhos percorridos pela Rural ao longo desses anos. O nome será Som na Rural 10 anos Indo e Voltando. Começaremos a gravar nas margens do Capibaribe, na rua da Aurora e iremos até o Sertão, na beira do São Francisco registrando artistas e manifestações culturais do nosso estado. Ao final, tudo será unido em 12 episódios para TV contemplados através do edital do Funcultura do audiovisual 2018. A ideia é fazer sem pressa, e ainda estamos pensando o roteiro. Como a Rural tem motor 69, carburado, precisamos ter cautela. Esperamos estar com o roteiro definido até o carnaval e já aproveitar as viagens do primeiro semestre para concluir as captações de imagens e tê- lo pronto em meados do segundo semestre de 2019, já que será produzido de forma independente. Temos muitas imagens de arquivo das nossas viagens também, além do que estamos registrando pelo Sertão. Vai ser tudo aproveitado.

Crédito: Arquivo Pessoal
Além do projeto Som na Rural, você tem tocado outras novidades em paralelo?
Estou participando de um núcleo criativo de um projeto do Fundo Setorial do Audiovisual contemplado pela Beluga Produções na construção de um roteiro para um longa sobre a lendária Banda Ave Sangria. Isso tem dado muito prazer, entendimento, inspiração e nobreza.
